Mesmo parecendo paradoxal esse título, na realidade, são dois momentos diferentes em que me vejo escrevendo para D. Pedro Casaldáliga.
¨Fica Pedro¨ foi o título de um texto escrito, por ocasião de sua aposentadoria, quando o Vaticano pretendia transferi-lo de São Félix do Araguaia para outro lugar em que não exercesse influência sobre a Paróquia onde realizava sua pastoral e funções eclesiásticas. Isso representaria abreviar seus dias. E, em defesa de sua permanência, petições, notas de apoio endereçadas ao Vaticano e todo um movimento forte, fizeram com que lhe permitissem a permanência na “terra de barro vermelho” que ele escolhera para viver, lutar e morrer.
Nessa época, eu fazia parte de Diretoria da Associação dos Auditores Fiscais de Mato Grosso e redigi um texto para que o colega Presidente assinasse e publicasse em nome da categoria, em seu apoio.
Agora escrevo, ¨Segue Pedro¨, no momento em que nos despedimos dele para sua viagem ao mundo imortal, onde certamente receberá em paz e luz todas as condecorações que o mundo terreno não consegue lhe conferir. Então, em forma de prece, presto-lhe essa homenagem.
Estive com ele apenas quatro vezes, o suficiente para sentir toda a sensibilidade de um sacerdote humilde, sábio e generoso para com a humanidade. Não era apenas um Bispo, era um verdadeiro pai dos pobres, dos índios, dos injustiçados, da natureza. Ouso compará-lo com Jesus pois estava por onde Jesus andou, junto aos desvalidos, inclusive socorrendo e enxugando as lágrimas de mulheres num prostíbulo.
Viveu sob ameaça de morte sempre. Percorria as terras do Araguaia e adjacências, lutando pelos órfãos da terra, subjugados pelos poderosos, empresários e políticos incentivados a tomar posse do território, excluindo e extinguindo os rurícolas e indígenas, incentivados pela Ditadura que pretendia garantir-se naquelas fronteiras. Por mais que se fale, impossível descrever o ser Pedro Casaldáliga.
Em meados de 1996, chego a São Félix do Araguaia com uma equipe do Grupo Móvel e através da saudosa Trindade, então advogada da CPT, consigo a honra de visitarmos aquele ser tão emblemático. Apresento-me como Coordenadora do Grupo, dizendo-lhe da nossa tarefa e pedindo-lhe desculpas pelo Estado se fazer presente 25 anos após sua primeira denúncia sobre a existência de Trabalho Escravo no Brasil e no Araguaia. Tivemos uma noite de encantamento onde todos puderam ouvi-lo e fazer suas indagações. Ao final, nos leva à capela onde fazia suas orações e todos ficamos boquiabertos com a beleza de tamanha simplicidade. Fizemos uma oração e ele nos deixou livres, depois pousando com cada um para uma foto.
Antes de nos despedirmos fez uma bênção especial para cumprirmos nossa missão. E quando encerramos , um Agente da Polícia Federal me confidenciou, com lágrimas:
– Vim aqui para prendê-lo como comunista, à época da ditadura, e hoje a emoção de conhecê-lo e reverenciá-lo é indescritível. Segue Pedro, vai num raio de luz ocupar o lugar de honra que te cabe, de homem bom e verdadeiro sacerdote, em busca da paz e da justiça social. Jesus te recepcione e conforte nas tuas saudades!
Valderez Maria Monte Rodrigues
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