FRENTE AMPLA EM DEFESA DA SAÚDE DOS TRABALHADORES
Com lançamento oficial previsto para o último dia 18 de março, adiado em razão da epidemia da COVID-19, já está em atividade a Frente Ampla em Defesa da Saúde dos Trabalhadores. A Frente foi uma iniciativa da Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (ABRASTT), presidida pelo Professor René Mendes, logo em seguida apoiada pelo Instituto Trabalho Digno (ITD) e pelo Fórum Acidentes do Trabalho (FORUMAT), contando agora com 23 instituições que atuam em defesa da Saúde dos Trabalhadores.
Conheça a seguir o documento-base (versão de 20/3/2020) que orienta a formação da Frente Ampla.
CONTEXTUALIZAÇÃO
Não parece ser nova a ideia, nem se conhece, com exatidão, quem primeiro a teve, mas ela, neste momento e por meio deste documento-base se expressa pela iniciativa de se buscar a construção de um amplo arco de alianças e de mecanismos inovadores de cooperação entre movimentos sociais, entidades de natureza sindical, instituições, grupos de trabalho e núcleos de estudo e pesquisa que têm em comum o compromisso com a promoção e defesa da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras.
Buscar a construção de uma frente em defesa da saúde dos trabalhadores é uma ideia que foi concebida, num primeiro momento, tendo abrangência geográfica e institucional brasileira, porém, em seguida, ela foi entendida, também, como necessariamente latino-americana, e quiçá, de potencial amplitude geográfica ainda mais ampla. A iniciativa constitui-se numa estratégia para buscar a superação de eventuais pequenas diferenças entre potenciais parceiros, sobretudo quando contrastada com a riqueza, importância, força e urgência de focarmos o que nos une, isto é, o que é maior e o que é essencial na atual conjuntura crescentemente adversa e hostil à vida e saúde dos trabalhadores e das trabalhadoras.
No caso brasileiro, o avanço devastador do tsunami neoliberal (ou ‘ultra neoliberal’, para alguns), que capturou e vem capturando os poderes legislativo, executivo e judiciário, tem se caracterizado, dia após dia, pela ‘legalização’ daquilo que até há pouco era considerado ‘ilegal’, o que afronta, em muitos casos, preciosos princípios da Carta Constitucional de 1988, e a própria história da construção dos direitos sociais no Brasil.
Foto de Александр Македонский (Ucrânia) Via pexels.com
A lista, a seguir, exemplifica, não de forma exaustiva, algumas das marcas deixadas por esta onda destrutiva de ataques aos direitos sociais, e em especial, aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras, com impactos sobre sua vida e saúde:
Emenda Constitucional no. 95/2016: congelou os gastos sociais públicos, por 20 anos, neles incluídas as rubricas da Educação e da Seguridade Social, entre outras.
Lei no. 13.429/2017: permitiu a “terceirização irrestrita”, porta principal para a precarização do trabalho.
Lei no. 13.467/2017: institucionalizou o “desmanche” da legislação trabalhista, com legalização da precarização do trabalho e destruição dos princípios do “trabalho decente ou digno”.
Lei no. 13.846/2019: instituiu ataques aos direitos sociais previdenciários, aos segurados e às seguradas, sempre sob o pretexto de combate a fraudes e a supostos privilégios. Os efeitos devastadores sobre a vida e saúde dos injustamente excluídos ainda não foram adequadamente avaliados, pois eles pertencem às franjas mais vulneráveis de todos os sistemas nacionais, e de consequente pouco interesse para as estatísticas econômicas.
Emenda Constitucional no.103/2019 (PEC 06.2019): a denominada “reforma previdenciária” com os seus impactos nefastos sobre a vida de trabalhadores e trabalhadoras, como amplamente debatido no meio acadêmico e sindical.
Medida Provisória no. 905/2019: tenta instituir o “contrato verde e amarelo”, e introduz importantes alterações na legislação trabalhista e previdenciária.
Lei Estadual – Goiás no. 20.514, de 16/7/2019 (“Lei Caiado”), regulamentada pelo Decreto no. 9.518, de 24/9.2019) que “autoriza para fins exclusivos de exportação, a extração e beneficiamento de amianto crisotila”, em desacordo com o que foi aprovado pelo Supremo Tribunal Federal, em novembro de 2017.
Normas Regulamentadoras (NR) de Saúde e Segurança do Trabalho: sob o pretexto de “modernização” normativa, estão sendo modificadas, apressadamente e sem consensos tripartites legítimos, quase todas as NR, algumas de grande alcance, como, por exemplo, NR 1, NR 3, NR 7, NR 9, NR 12, NR 18 e, principalmente, a importante NR 17.
Por certo, os efeitos destes ataques mais recentes sobre o viver, o adoecer e o morrer de trabalhadores e trabalhadoras ultrapassam e muito o que já vinha sendo denunciado por meio da relativamente vasta e abundante literatura produzida pelos movimentos sociais e pela academia, nas últimas décadas. Mais do que nunca, faz-se necessário que a produção do conhecimento seja mais construída e apropriada pelos próprios trabalhadores e trabalhadoras, e que se superem barreiras de comunicação, barreiras de acesso e socialização, e eventuais barreiras de preconceito ou desconfiança entre parceiros institucionais.
Como já mencionado, a gravidade do momento, intensificada pela histórica assimetria de forças no mundo capitalista, obriga a reunir nossas forças – forças do saber, forças do conhecimento, forças das ideias, forças da capacidade de articulação política etc. – para enfrentamentos mais organizados, mais estruturados, mais ‘competentes’, mais focados no que é essencial para a agenda da saúde de trabalhadores e trabalhadoras, na atual conjuntura brasileira e latino-americana.
A PROPOSTA DE CRIAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DE UMA “FRENTE AMPLA”
A “Frente Ampla em Defesa da Saúde de Trabalhadores” é uma iniciativa estratégica de natureza política e multi institucional, que visa desenvolver e aperfeiçoar parcerias conceituais e de cooperação entre movimentos sociais, entidades de natureza sindical, instituições, grupos de trabalho e núcleos de estudo e pesquisa que tenham em comum o compromisso de promoção e defesa da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras.
O objetivo principal desta iniciativa estratégica – plural, democrática e suprapartidária – é o de fortalecer e otimizar a capacidade da sociedade civil – em especial, trabalhadores e trabalhadoras – para defender a vida e a saúde dos que vivem de seu trabalho.
Desde já, e sem excluir outras bandeiras de luta, neste momento (março de 2020), as instituições parceiras, apoiadoras e instituidoras da FRENTE AMPLA EM DEFESA DA SAÚDE DOS TRABALHADORES unem-se em torno da seguinte AGENDA URGENTE E PRIORITÁRIA
1) CONTRA os contínuos ataques e ameaças de perda de direitos de proteção social no trabalho, e de direitos sociais, previdenciários e trabalhistas, que alcançam e fragilizam trabalhadores e trabalhadoras, assim como segurados da Previdência Social que têm sido impedidos de ter acesso aos direitos que fazem jus;
2) CONTRA o desmantelamento do Sistema Único de Saúde (SUS), conquista social, orientada pelos princípios da universalidade de acesso, integralidade do cuidado, com equidade e participação da comunidade, dos trabalhadores e do controle social a todxs cidadãos brasileiros;
3) CONTRA o ataque às instituições públicas do Trabalho, como a extinção do Ministério do Trabalho e Emprego e as restrições ao sistema de fiscalização do trabalho, e CONTRA as medidas que enfraquecem as instituições de pesquisa, como a Fundacentro e a Fiocruz, entre outras que produzem conhecimento na área de saúde dos trabalhadores e trabalhadoras;
4) CONTRA a adoção de modelos de desenvolvimento e de uso de novas tecnologias que implicam perda de postos de trabalho (desemprego) sem a correspondente e obrigatória adoção de políticas compensatórias e de abertura de novas oportunidades de trabalho;
5) CONTRA todas as formas de precarização do trabalho;
6) CONTRA a adoção de modelos de organização e gestão do trabalho perversos e patogênicos baseados na super exploração de quem trabalha; a intensificação do trabalho baseada em aumento dos ritmos de trabalho, no aumento das horas trabalhadas e na redução de pausas e repouso; os modelos de gestão do trabalho baseados em técnicas perversas e no assédio moral; a exigência de produtividade, baseada em metas intencionalmente inatingíveis; a redução dos postos de trabalho e as demissões como prática constante de gestão e ameaças; a ‘captura da subjetividade’ e outras técnicas manipulatórias;
7) CONTRA todas as formas de discriminação de trabalhadores, em bases de gênero, de orientação sexual, étnica/racial, de opção religiosa, de nacionalidade, de opção política ou partidária, idade, deficiência, condição de saúde, dentre outras;
8) CONTRA todas as formas de trabalho infantil e de adolescentes;
9) CONTRA todas as formas de trabalho escravo, antigas e contemporâneas;
10) CONTRA a exposição descontrolada a substâncias químicas tóxicas nos ambientes de trabalho, especialmente a exposição a agrotóxicos, às nanopartículas e aos cancerígenos;
11) PELA proibição imediata da retomada da exploração do amianto no estado de Goiás (Lei Estadual no. 20.514, de 16/7/2019), em desacordo com o que foi aprovado pelo Supremo Tribunal Federal, em novembro de 2017.
12) PELA revogação da Emenda Constitucional no 95/2016, que congelou os gastos sociais públicos, neles incluídas as rubricas da Educação e da Seguridade Social, entre outras;
13) EM DEFESA do fortalecimento e ampliação da atuação da Saúde do Trabalhador no Sistema Único de Saúde (SUS), conforme previsto na Lei no. 8.080/1990, em especial nos artigos 6º, 13º, 15º, 17º, 18º.
14) EM DEFESA da efetiva implementação da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (Portaria no.1.823/2012);
15) PELA garantia do direito ao sigilo profissional e confidencialidade de informações dos trabalhadores, com a revogação definitiva do artigo 9º. da Resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) 2.183/2018, respeitando-se códigos de ética nacional e internacionais.
16) CONTRA a persistente e vergonhosa ocorrência de mortes evitáveis de trabalhadores e trabalhadoras, causadas por acidentes do trabalho.
17) CONTRA a crescente incidência de sofrimento e adoecimentos relacionados ao trabalho, com destaque para o grupo das “patologias da sobrecarga e do desgaste” (fadiga física e mental; lesões por esforços repetitivos/ distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho – LER/DORT -; Síndrome de Burnout, e mortes por exaustão e excesso de trabalho, entre outras); e para grupo das “patologias da solidão ou silêncio” (transtornos mentais depressivos e suicídio relacionado ao trabalho, entre outras).
18) PELA constante e diuturna vigilância de outros problemas emergentes de interesse da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras, e do meio ambiente.
PRINCIPAIS MEIOS DE AÇÃO DA “FRENTE AMPLA”
Dentro de seu escopo fundante de desenvolvimento e aperfeiçoamento de parcerias conceituais e de cooperação no campo da promoção e defesa da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras, a “Frente Ampla em Defesa da Saúde de Trabalhadores” terá os seguintes propósitos e meios de ação:
(1) Identificar e mapear os movimentos sociais, entidades de natureza sindical, instituições, grupos de trabalho e núcleos de estudo e pesquisa que atuam no campo da promoção e defesa da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras, com o propósito de potencializar o seu trabalho e impacto por meio de parcerias conceituais e de cooperação.
(2) Desenvolver e atualizar inventários dos recursos e das capacidades instaladas, das expertises e dos engajamentos de pessoas, de equipamentos e instalações, de acervos de material técnico ou didático produzido, de estudos e pesquisas realizados pelos parceiros e parceiras que vierem a participar da “Frente”.
(3) Compartilhar e socializar recursos para fins comuns, isto é, dentro do escopo de defesa e promoção da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras.
(4) Desenvolver, de forma articulada e participativa, análises de conjuntura e discussão de pautas temáticas prioritárias para a promoção e defesa da saúde de trabalhadores e trabalhadoras no Brasil e nos países da América Latina.
(5) Desenvolver, de forma articulada e participativa, estratégias de ação conjunta, papéis e responsabilidades de cada parceiro(a) na resistência, luta e construção de mudanças políticas, tecnológicas, legais e institucionais.
(6) Elaborar e emitir “pareceres conjuntos”, “notas técnicas”, “posicionamentos” e outros documentos e expressões de mídia, em defesa da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras, sempre que necessário e acordado entre os parceiros e parceiras componentes da “Frente”.
(7) Desenvolver mecanismos de fortalecimento institucional dos movimentos sociais, entidades de natureza sindical, instituições, grupos de trabalho e núcleos de estudo e pesquisa, participantes da “Frente”, com o objetivo de aumentar sua acessibilidade e competitividade no acesso a fontes de financiamento e fomento de atividades de pesquisa, de ensino e de prestação de serviços à comunidade.
(8) Articular-se com outras “frentes” e movimentos sociais nacionais, latino-americanos e globais de escopo semelhante ou convergente, quer no campo da saúde e segurança de trabalhadores e trabalhadoras, no senso estrito, como no campo do Direito Ambiental do Trabalho, e outras ‘bandeiras’ sociais relevantes.
(9) Outras formas a serem propostas.
GOVERNANÇA DA “FRENTE AMPLA”
Nesta primeira Proposta, e aberto para discussão e contribuições, propõe-se que a “Frente Ampla em Defesa da Saúde de Trabalhadores” tenha como instância superior de governança um Colegiado formado por dirigentes (ou representantes indicados pelos/as dirigentes) de todos os movimentos sociais, entidades de natureza sindical, instituições, grupos de trabalho e núcleos de estudo e pesquisa que formalizarem sua adesão à iniciativa.
Como instância operacional de apoio e gestão, haveria uma Secretaria Executiva, com perfil técnico, administrativo e político a ser definido pelo Colegiado.
MOVIMENTOS SOCIAIS, ENTIDADES E INSTITUIÇÕES PARCEIRAS
PROPONENTES (posição em 20/3/2020):
EM ORDEM DE ADESÃO:
Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (ABRASTT);
Instituto Trabalho Digno (ITD);
Fórum Acidentes do Trabalho (FÓRUMAT);
Fórum Intersindical Saúde – Trabalho – Direito (Fiocruz/RJ);
Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA);
Núcleo de Estudos Trabalho, Saúde e Subjetividade (NETSS/Unicamp);
Rede de Estudos do Trabalho (RET);
Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (DIESAT);
Associação Brasileira de Ergonomia (ABERGO);
Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (ABET);
Associação Brasileira de Fisioterapia do Trabalho (ABRAFIT);
Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia (ABMMD);
Núcleo de Estudos e Pesquisa em Saúde e Trabalho (NEST/UFRGS);
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES);
Grupo de Estudos TRAGES (Trabalho, Gestão e Saúde/UFG);
Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST/RS);
Associação Juízes para a Democracia (AJD);
Associação dos Expostos e Intoxicados por Mercúrio Metálico (AEIMM);
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH/ENSP/Fiocruz);
Departamento de Saúde Coletiva – Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (DSC/FCM/Unicamp);
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO);
Associação Nacional de Engenharia de Segurança do Trabalho (ANEST);
Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho(PPSAT/UFBA)
EM ORDEM ALFABÉTICA:
Associação Brasileira de Ergonomia (ABERGO);
Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (ABET);
Associação Brasileira de Fisioterapia do Trabalho (ABRAFIT);
Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia (ABMMD);
Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO);
Associação Brasileira de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (ABRASTT);
Associação Brasileira dos Expostos ao Amianto (ABREA);
Associação dos Expostos e Intoxicados por Mercúrio Metálico (AEIMM);
Associação Juízes para a Democracia (AJD);
Associação Nacional de Engenharia de Segurança do Trabalho (ANEST);
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (CEBES);
Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (CESTEH/ENSP/Fiocruz);
Departamento de Saúde Coletiva – Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp (DSC/FCM/Unicamp);
Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (DIESAT);
Fórum Acidentes do Trabalho (FÓRUMAT);
Fórum Intersindical Saúde – Trabalho – Direito (Fiocruz/RJ);
Fórum Sindical de Saúde do Trabalhador (FSST/RS);
Grupo de Estudos TRAGES (Trabalho, Gestão e Saúde/UFG);
Instituto Trabalho Digno (ITD);
Núcleo de Estudos e Pesquisa em Saúde e Trabalho (NEST/UFRGS);
Núcleo de Estudos Trabalho, Saúde e Subjetividade (NETSS/Unicamp);
Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho (PPSAT/UFBA)
Rede de Estudos do Trabalho (RET).
ESTA PROPOSTA É DE TODOS NÓS!
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